A psicodinâmica do
trabalho e, sobretudo, as ideias apresentadas por Christophe Dejours oferecem
novas e mais adequadas visões acerca de questões que estão relacionadas ao trabalho.
Um dos argumentos defendido pelo referido autor se associa à construção da
identidade dos sujeitos estando em interação com diferentes situações, inclusive
as relações de trabalho.
A abordagem sobre a
identidade como uma dimensão intimamente ligada à questão do trabalho é
explicada por Dejours (2004) a partir dos acontecimentos que se dão dentro e
fora do ambiente de trabalho. Mais especificamente, diz-se que abordagem citada
pode ser mais facilmente avaliada através do trabalho de reprodução - trabalho
doméstico - e do amor, na medida em que estes podem ser observados na esfera
privada.
Antes de apresentar os
fatores que, geralmente, estão associados ao trabalho de reprodução, tornam-se
necessárias as conceituações e considerações acerca da identidade e do amor. Com
isso, a identidade é vista como um sentimento de unidade da personalidade e que
está em constante movimento durante o curso de vida do sujeito. O amor, por sua
vez, é um sentimento ao qual se faz referência mediante a reprodução das
relações de dominação no espaço privado.
Uma idéia mais profunda
acerca da relação existente entre identidade, trabalho de reprodução e amor, surge
exatamente de questões associadas ao último termo citado. Conforme aponta Dejours,
o amor é constituído pelos componentes identitário, sexual e vínculo. O elemento
identitário se refere à possibilidade das pessoas se reconhecerem a partir do
outro através do sentimento discutido.O amor também implica uma economia
erótica,mas também abrange o vínculo.
O vínculo, que é
intensamente observado na constituição das relações amorosas, é utilizado pelos
seres humanos na mobilização dos recursos que lhes são disponíveis, buscando
ajustá-los de acordo com as suas expectativas. No entanto, o vínculo também é
apontado como um possível fator desencadeante da alienação entre os parceiros.
Assim, esse importante elemento participa não apenas da estrutura das relações
de amor, mas das próprias relações ou realizações de tarefa que envolvem o
contexto privado.
No trabalho de
reprodução – entendido aqui como o trabalho doméstico – o vínculo pode
influenciar o registro das relações de dominação e submissão num ambiente familiar.
As tarefas domésticas e todo trabalho fica sob a responsabilidade daquele que
se submete, e sob o ponto de vista vincular aquele que domina e o que se
submete assumem muito bem seus papéis.
O termo trabalho de
reprodução representa as multideterminações do quadro de trabalho que é
desenvolvido em espaços domésticos. Pode-se falar, então, que as relações de
dominação/submissão são reflexos da negação ou reconhecimento da diferença
anatômica entre os sexos, do trabalho produtivo e do próprio trabalho reprodutivo.
Nesses três momentos, comumente, homens e mulheres apresentam tendências
distintas com relação a aceitar ou não determinada realidade. É importante
ressaltar que esses três processos estão situados em épocas diferentes da vida
de uma pessoa. O primeiro encontra-se ligado ao desenvolvimento infantil, enquanto
os últimos podem ser vistos na vida adulta, sendo mais recentes.
De acordo com os
aspectos apresentados acima, o sujeito que percebe e reconhece os elementos da
realidade dada assume o papel da submissão e aquele que nega domina. A
justificativa para essa configuração, provavelmente, relaciona-se com o fato de
que o reconhecimento dá as bases para saber lidar com um possível conflito,
enquanto a negação não o permite.
Dessa maneira, é
possível falar que o trabalho produtivo, ou seja, aquele que é desenvolvido num
espaço organizacional e o desenvolvimento infantil exercem influências nas
relações familiares, abrangendo a própria noção de trabalho que se estabelece
nessa rede social.
Referência
DEJOURS, Christophe. As
relações domésticas: entre amor e dominação. In: LANCMAN, Selma; SZNELMAN, Laerte I. (org.). Christophe Dejours:
Da psicopatologia à psicodinâmica do
trabalho. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2004.
Tamira Mercês